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LIÇÃO Nº 11 – O JULGAMENTO E A SOBERANIA PERTENCEM A DEUS

LIÇÃO 11

Deus é soberano, o Senhor, nós, Seus servos..   

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INTRODUÇÃO

 – Na sequência do estudo da epístola universal de Tiago, estudaremos hoje a passagem de Tg.4:11-17, quando o irmão do Senhor analisa outro perigo para a vida cristã sobre a face da Terra: a presunção humana.

– Deus é soberano, o Senhor, nós, Seus servos, de forma que não podemos julgar o próximo nem tampouco querer viver como se Deus não existisse.

I – NÃO FALAR MAL DO OUTRO  

– Na sequência do estudo da epístola universal de Tiago, estudaremos hoje a passagem de Tg.4:11-17, quando o irmão do Senhor analisa outro perigo para a vida cristã sobre a face da Terra: a presunção humana.

– Tiago, como temos visto nas últimas lições, a partir do capítulo 3, passa a apontar alguns perigos durante a nossa peregrinação terrena. Já temos visto que a língua, a sabedoria terrena e a natureza pecaminosa são obstáculos, impedimentos para que caminhemos seguramente rumo ao céu, que é o propósito da salvação na pessoa de Cristo Jesus.

– Assim, após ter mostrado a necessidade que temos de nos humilharmos debaixo da potente mão de Deus, Tiago passa a discorrer sobre outro grande perigo para a vida cristã, para a nossa vida espiritual, que é, de certo modo, decorrência da atitude de autossuficiência que domina o homem quando se deixa levar pela carne: a presunção humana, que o irmão do Senhor detecta em dois comportamentos: o falar mal do próximo e o elaborar projetos e planos à revelia de Deus.

– Depois de ter dito que o homem tem de se humilhar diante de Deus para que seja exaltado, o pastor da igreja em Jerusalém parece mudar de assunto, ao dizer: “Irmãos, não faleis mal uns aos outros. Quem fala mal de um irmão, e julga a seu irmão, fala mal da lei, e julga a lei; e, se tu julgas a lei, já não és observador da lei, mas juiz.” (Tg.4:11).

– Há, entretanto, uma aparência de mudança de assunto. Tiago está a desenvolver a questão relativa à soberba do homem que, dominado pela carne, não dá ouvidos à voz do Senhor, vive como se Deus não existisse.

– O homem que se deixa levar pela carne, que vive como se Deus não existisse, um verdadeiro “ateísta prático”, é um ser que se acha “igual a Deus”, que creu na mentira satânica proferida, pela vez primeira, aos nossos primeiros pais (Gn.3:5) e que é seguidamente repetida a todos os homens a partir de então.

– Quem se acha “igual a Deus”, não admite que Deus é o Senhor de todas as coisas, que se deva obediência ao Senhor e, por isso mesmo, não tem motivo algum para amar o próximo ou se entender igual ao próximo, que é imagem e semelhança de Deus.

– Quem se acha “igual a Deus”, entende que é ele quem deve determinar o que é o certo e o errado, que é ele quem deve decidir o que deve ser feito, ou não, e, deste modo, dentro do individualismo que é característico daqueles que se deixam levar pela carne, certamente surgirá a atitude de se considerar superior ao próximo, ao outro, outro este, aliás, que é tratado como mero instrumento para a satisfação do próprio ego.

– Por isso, quando Tiago fala que não devemos falar mal uns dos outros, está a nos ensinar que não podemos nos achar no direito de considerar o outro como inferior a nós mesmos, que devemos ver no outro a imagem e semelhança de Deus, lembrando, assim, que, se Deus não faz acepção de pessoas, não podemos também fazê- lo, que é o Senhor, dono de todas as coisas (Sl.24:1), quem deve avaliar a conduta de cada qual, pois é Ele o parâmetro do certo e do errado.

– Quando falamos mal do próximo, em especial, de um irmão, estamos nos considerando como o aferidor da medida, como o parâmetro do certo e do errado, o que é, simplesmente, nos colocarmos no lugar de Deus e isto é extremamente complicado, pois estamos atentando contra a soberania divina.

– Tiago aqui evoca o ensino de Jesus no sermão do monte, que, ao trazer o ensino a respeito do homicídio, também abordou esta questão importantíssima para que saibamos quem somos e quem é Deus.

– O Senhor, logo após ter dito que a justiça dos Seus discípulos deveria exceder a dos escribas e fariseus, analisa o sexto mandamento, ou seja, o mandamento “não matarás”, dando o devido alcance a este mandamento, quando afirma: “qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão será réu de juízo e qualquer que disser a seu irmão: Raca, será réu do sinédrio e qualquer que lhe disser: Louco, será réu do fogo do inferno” (Mt.5:22).

– Jesus deixa bem claro, nesta Sua interpretação e aprofundamento do sexto mandamento, que o respeito à dignidade do outro não está apenas no dever que temos de preservar a vida física e biológica do próximo, de não ceifarmos esta sua existência terrena, mas, também, em preservarmos a sua dignidade e respeito, reconhecendo que ele é tão imagem e semelhança de Deus quanto nós mesmos.

– Quando entendemos que Deus é o Criador e Senhor de todas as coisas e que somos Suas criaturas, reconhecemos que cada ser humano é tão digno quanto nós mesmos, que estamos debaixo do senhorio deste Criador e, por isso mesmo, não podemos, em hipótese alguma, querermos ser melhores do que qualquer ser humano, pois sabemos que maior é Deus e ninguém mais.

– Este entendimento leva-nos, naturalmente, à consideração de que não podemos, de forma alguma, querer reduzir o outro a nossos parâmetros, a nossas medidas, a nossos juízos e conceitos, pois o outro é tão digno quanto nós e não pode ser considerado como sendo inferior a nós.

– Ora, se entendemos que somos iguais aos outros, pelo menos diante de Deus, como, então, ter base e respaldo para entender que o outro é pessoa que deve ser inferiorizada por nós, que somos melhores do que ele? Com base em que podemos dizer que fulano ou sicrano não vale coisa alguma, que é desprezível ou indigno?

– Quando, porém, não consideramos o senhorio de Deus, quando nos pomos em lugar d’Ele e passamos a falar mal de alguém, estamos a dizer que tal pessoa nos é inferior, que somos os aferidores da medida, aqueles que se constituem em modelo e parâmetro da existência humana sobre a face da Terra. Somente quem assim se considera pode falar mal de alguém, pode emitir juízos a respeito de alguém, considerando-se superior a esta pessoa.

– Jesus disse que quem assim procede é “réu de juízo”, ou seja, está “sujeito ao juízo”, porque toma indevidamente o lugar que somente a Deus pertence, repetindo, assim, o mesmo caminho trilhado por Satanás que se achou superior ao próprio Deus, querendo tomar o lugar do seu próprio Criador (Is.14:13,14).

– Da mesma forma que o Senhor, ante a rebeldia de Satanás, julgou esta Sua criatura, também o fará com relação ao ser humano que assim se portar, pois Deus é imparcial, não só e justo, como é a própria justiça. A propósito é precisamente isto que nos diz o salmista Davi, ao afirmar que o Senhor destruirá todos quantos difamam o seu próximo ainda que às escondidas, precisamente por ter um olhar altivo e coração soberbo (Sl.101:5).

OBS: “…Com os falsos testemunhos, proíbe-se também este mandamento a difamação do próximo, fonte de tantos e graves males. São muitas e taxativas as passagens escriturísticas onde se repreende e se condena vício tão ruim: reduzirei ao silêncio ao que em segredo detrai o seu próximo (Sl.101:5); não faleis mal um dos outros, irmãos (Tg.4:11).…” (CATECISMO ROMANO. Capítulo VIII – Oitavo mandamento do Decálogo – item III.b. Cit. Tg.4:11,12, n.3880. Disponível em: http://www.clerus.org/bibliaclerusonline/pt/index.htm Acesso em 15 jul, 2014) (tradução nossa de texto em espanhol).

– O Senhor diz que é “sujeito a juízo” quem se encolerizar contra o seu irmão sem motivo, ou seja, quem se achar com o direito de entender que o outro lhe é inferior, que o outro é mero instrumento da satisfação das suas próprias vontades, pois somente quem pensa assim é que se enraivece, que se sente contrariado em relação ao outro, outro que não está servindo aos interesses egoísticos deste que se encolerizou, que não é um mero instrumento para a realização de seus objetivos e planos nesta vida sobre a face da Terra.

– Será que não temos nos comportado desta maneira, amados irmãos? Vivemos dias difíceis, dias em que, como profetizou o apóstolo Paulo, haveria homens amantes de si mesmos, que não teriam afeto natural, que são mais amigos dos prazeres do que amigos de Deus (II Tm.3:1-4) e que, por isso mesmo, não pensam duas vezes para se enraivecer contra qualquer pessoa que não atender aos seus próprios interesses.

– Este tipo de conduta revela tão somente o predomínio da carne e, como tal, que esta pessoa não está a agradar a Deus (Rm.8:8), distanciando-se cada vez mais do Senhor, já que a inclinação para carne é morte (Rm.8:6). Quando alguém se encoleriza contra alguém é porque está dominado pela carne, vê no outro um impedimento, um obstáculo, não um igual, alguém que também foi criado à imagem e semelhança de Deus.

– O Senhor, então, na continuidade de seu ensino sobre o real sentido do sexto mandamento, diz que é “réu do sinédrio”, ou seja, digno de ser julgado, aquele que diz ao seu irmão “Raca”, palavra aramaica que significa, consoante nos diz a Bíblia de Estudo Palavra Chave, “…homem vazio, isto é, sem valor (como uma expressão de total difamação)” (verbete 4469, p.2385).

– Difamar alguém, menosprezá-lo, ofender-lhe a dignidade nada mais é que considerar-se superior, como aquele que pode medir os demais pelos seus próprios conceitos e valores, como se fôssemos “iguais a Deus”. Quem fala mal de um irmão não considera o irmão como irmão, mas como um subalterno, como uma pessoa de segunda classe, que não tem a mesma dignidade daquele que está a falar mal.

– Tiago, quando nos ensina a não falarmos mal uns dos outros, está a mostrar que a atitude da humilhação, que permitirá que nos sujeitemos a Deus e mantenhamos a carne no seu devido lugar, que é o de estar crucificado com Cristo até o dia do arrebatamento da Igreja, é incompatível com o menosprezo com o próximo, pois, quando nos sujeitamos a Deus, compreendemos que devemos considerar o próximo como pessoa dotada de tão ou maior dignidade que nós mesmos.

– O sentimento de autossuficiência leva-nos a desprezar o outro, a menosprezá-lo, a considerá-lo como um “nada” ou “menos do que nada”, como se nós fôssemos melhores do que este que assim consideramos, pois, afinal de conta, esta é a condição de todo ser humano diante de Deus, como podemos observar em Is.40:17 e 41:24. Não é à toa, pois, que o apóstolo Paulo tenha também alertado os salvos a que não procedessem deste modo, sempre considerando os outros superiores a si mesmo, dizendo ser esta uma prova de humildade (Fp.2:3).

– Falar mal do outro é exteriorizar este indevido sentimento de autossuficiência e de superioridade, que traduz um predomínio da carne e um atentado contra a soberania de Deus.

– Tiago explica porque não se deve falar mal do irmão. Diz o irmão do Senhor que quem assim procede está a julgar a seu irmão, pondo-se, pois, na condição de juiz, que não é, efetivamente, a posição que um ser humano pode assumir, uma vez que se trata de prerrogativa exclusiva de Deus, o juiz de toda a terra (Gn.18:25).

– Neste ponto, aliás, devemos aqui dissipar alguns equívocos que decorrem desta afirmativa, que, ademais, corrobora outro ensino do sermão do monte, quando Jesus afirma que não devemos julgar para que não sejamos julgados (Mt.7:1).

– Alguns, ao lerem tais textos, entendem que o salvo em Cristo Jesus não deve fazer qualquer julgamento e, outros, ainda, recriminam todos os servos de Deus que, por exemplo, seguem a carreira da magistratura, tornando-se juízes, pois estariam a “violar a Bíblia Sagrada”. Nada mais inexato e equivocado!

– Devemos ter em mente, por primeiro, que Deus criou o homem como um ser moral e racional, ou seja, um ser que pensa e pode discernir entre o certo e o errado. Se assim é, é evidente que o ser humano, por sua própria natureza, faz juízos, faz julgamentos, pois, se pensa, deve, sim, analisar a realidade e tirar conclusões daquilo que está à sua volta.

– A lógica ensina que o pensamento é constituído de algumas operações, entre as quais se encontra a de fazer julgamentos, fazer juízos. Quando dizemos que “João está doente” é porque fizemos um julgamento, analisamos o estado de João e o estado da doença ou da saúde para concluir que João está sem saúde, está acometido de uma enfermidade.

– Deste modo, não podemos, em absoluto, considerar que o homem, uma vez salvo por Cristo Jesus, deixe de fazer julgamentos, pois ele foi criado para isto, já que Deus o fez um ser pensante, um ser racional e, como tal, sempre proferirá juízos, sempre proferirá julgamentos.

– Mas há ainda outro equívoco a ser sanado, o que diz respeito que não podemos exercer tarefas de julgadores, de juízes. Ora, se Deus não permitisse que os homens fossem julgados por seus pares nas mais diversas instâncias da vida em sociedade, entre as quais se destaca o Poder Judiciário, jamais teria determinado que, em Israel, houvesse juízes, como o fez (Dt.16:18; 25:1; I Sm.2:25), sendo certo que homens tementes a Deus que governaram o povo de Israel se notabilizaram precisamente por deixar bem organizado o sistema judicial (II Cr.19:5,6; Ed.7:25).

– Deus, na organização social dos homens, estabeleceu que houvesse juízes que julgassem as pessoas, mas tal julgamento nada tem que ver com o que Tiago e Jesus condenam, porquanto é um julgamento que não tem como medida ou parâmetro o julgador, mas, sim, a lei que foi estabelecida como regra de convivência entre os homens.

– O Senhor Jesus, mesmo, disse, certa feita, que deveríamos julgar segundo a reta justiça e não, segundo a aparência (Jo.7:24), ao mostrar que o julgamento é inevitável na vida humana e na vida social, mas que o julgamento há de ser feito conforme um parâmetro, um modelo, uma medida que é estatuída pelo próprio Deus, qual seja, a “reta justiça”.

– Assim, não estamos impedidos de julgar, pois isto é da própria natureza racional do homem e uma necessidade para que se mantenha a convivência, mas este julgamento há de usar como parâmetro o próprio Deus, que é a “reta justiça”, este julgamento não há de ser feito conforme o nosso ego, os nossos interesses, mas segundo os parâmetros estabelecidos pelo próprio Senhor. Como diz a Bíblia de Estudo de Genebra, ao comentar Tg.4:11, Tiago está aqui a condenar “…aqueles que muito arrogantemente condenando tudo o que não lhes agrada…” (Bíblia de Estudo de Genebra, nota 7 a Tg.4. Disponível em: http://www.biblestudytools.com/commentaries/geneva-study-bible/james/james-4.html Acesso em 15 jul, 2014) (tradução nossa de texto em inglês).

– Assim sendo, quando Tiago está a dizer que não podemos julgar a nosso irmão, não está dizendo que não pode o irmão ser julgado por um juiz ou até mesmo por nós mesmos, dentro de nossa capacidade racional, mas, sim, que não podemos julgar o irmão segundo os nossos ditames, as nossas vontades, os nossos interesses. Se assim fizermos, estaremos nos considerando superiores a ele e tomando indevidamente o lugar de Deus.

– Por isso mesmo, o rei Josafá, quando estabeleceu juízes em Judá, teve o cuidado de dizer-lhes que deveriam ter com eles o temor do Senhor, pois em Deus não há iniquidade, aceitação de pessoas ou de presentes (II Cr.19:7), indicando, assim, que os juízes deveriam ter como parâmetro a lei de Deus para proferir as suas sentenças, como critério aquilo que o Senhor Jesus denominou de “reta justiça”.

– Josafá, neste passo, tão somente repete o que Moisés já dissera ao povo, em um de seus discursos de despedida do livro de Deuteronômio, quando manda que os juízes que fossem constituídos em Israel não torcessem o juízo, nem fizessem acepção de pessoas, nem tomassem peitas, mas seguissem a justiça (Dt.16:18-20).

– Vemos, portanto, que o que Tiago e o Senhor Jesus condenam não é o ato do julgamento em si, que é inevitável dentro da racionalidade humana, mas que nós nos façamos aferidores de medida, que estabeleçamos juízos com base em nossos interesses e em nossa individualidade, difamando, injuriando e até caluniando alguém única e exclusivamente porque esta pessoa obstacula ou impede a satisfação de nossa concupiscência.

– Quando assim procedemos, deixando de lado a Palavra de Deus, a “reta justiça” como modelo aferidor da correção, ou não, de uma determinada atitude, estamos nos tornando juízes, estamos nos tornando não executores da lei de Deus, como o eram os juízes e oficiais em Israel, mas, sim, em elaboradores de uma nova lei, de um novo parâmetro, pelo qual julgamos a outrem. OBS: “…Este é um mal abominável, porque nos faz esquecer o nosso lugar, que deveria ser o de cumpridores da lei, mas nos pomos acima dele, como se nós fôssemos juízes.

Aquele que é culpado de pecado e que aqui é advertido não é um cumpridor da lei, mas um juiz; ele assume um ofício e um lugar que não pertence a ele, mas estará certo que sofrerá no final por sua presunção. Aqueles que estão sempre prontos a se fazer de juízes da lei geralmente são os que mais fracassam na obediência a ela…” (HENRY, Matthew. Comentário completo sobre toda a Bíblia, com. Tg.4:11-17. Disponível em: http://www.biblestudytools.com/commentaries/matthew-henry-complete/james/4.html Acesso em 15 jul, 2014) (tradução nossa de texto em inglês).

– É por este motivo que, ao mesmo tempo em que Tiago nos diz que quem assim procede se tornou um juiz, também, com esta atitude, arroga-se o direito de ser um legislador. OBS: “…Como o fato de ‘julgar’ o crente companheiro envolve ‘julgar’ esta lei? Uma vez que Tiago contrasta o ‘julgar a lei’ e a ‘prática da lei’, ele, aparentemente, pensa que o fracasso no cumprimento da lei inclui uma negação implícita da autoridade da lei.

Por mais ortodoxo e elevado que seja o nosso conceito acerca da lei de Deus, nosso fracasso em cumpri-la realmente diz ao mundo que, de fato, não a valorizamos tanto. Novamente vemos subir à superfície a compreensão que Tiago tem do cristianismo como algo cuja realidade deve ser testada pela medida da obediência.…” (MOO, Douglas J. Tiago: introdução e comentário. Trad. de Robinson Malkomes. Escriba digital, p.151).

– Todos conhecemos a “teoria da separação dos poderes”, elaborada pelo Barão de Montesquieu (1689-1755), filósofo político francês, que foi um dos marcos decisivos para a democracia moderna, que permitiu a limitação do poder estatal e o desenvolvimento da cidadania. Pois bem, embora, à evidência, Tiago não pudesse se fundamentar nesta teoria, nela podemos entender o que o irmão do Senhor está a nos dizer.

– Segundo a teoria de Montesquieu, o Estado, ao controlar a vida dos cidadãos, possui três grandes poderes: o de elaborar leis, o de executar estas leis e o de interpretar estas leis, julgando as atitudes dos cidadãos de acordo com as leis existentes. Ora, para que não haja uma tirania, faz-se necessário que tais poderes sejam divididos, que órgãos diferentes e pessoas diferentes exerçam cada um destes poderes, pois, assim, teremos o equilíbrio e a limitação da ação do Estado sobre os indivíduos.

– Tiago diz-nos que, quando julgamos a outrem, quando nos tornamos o critério de análise do comportamento das outras pessoas, estamos querendo nos arrogar todos os poderes e, assim, sermos verdadeiros tiranos em relação aos demais seres humanos, tendo, praticamente, o direito de vida e morte sobre eles.

– Tiago afirma-nos que, quando julgamos a outrem, a partir de nós mesmos, estamos nos fazendo juízes, pois estamos a determinar a condenação, ou não, do próximo, mas usando como critério o nosso próprio ego. Não estamos a utilizar a lei de Deus, mas, sim, a nossa própria lei, que criamos em função de nossos interesses e caprichos. Por isso, diz o irmão do Senhor, somos, também, legisladores, visto que nós é que elaboramos a lei.

– Deste modo, constituímo-nos, a um só tempo, como legisladores e juízes, e mais do que isso, como executores da própria lei que elaboramos, pois é sabido que não há como nos tornarmos julgadores se, antes, esta lei não for posta em prática. Em outras palavras, lembrando o que disse Montesquieu, arrogamos a nós todos os poderes, fazemo-nos “todo-poderosos” e o que é isto senão nos colocarmos no lugar de Deus?

– Tiago lembra-nos, então, que só há um Legislador e um Juiz que pode salvar e destruir e este, sabemos todos, é o Senhor, o Criador de todas as coisas e que, ao Se revelar aos patriarcas, já mostrava ser “El- Shadday”, ou seja, o “Todo-Poderoso” (Gn.17:1; 28:3; 35:11; 43:14; 48:3; 49:25; Ex.6:3; Jó 5:17; 6:4,14; 8:3,5; 11:7; 13:3; 15:25; 21:15,20; 22:3,17,23 etc.).

– Tiago diz que a posição do homem é a de ser um “observador da lei”, ou seja, alguém que deve cumprir aquilo que Deus determinou, que deve buscar viver de acordo com os parâmetros morais estatuídos pelo Senhor, não cabendo senão “executar a lei”. É, por isso, aliás, que pode haver juízes entre os servos de Deus, visto que os juízes nada mais farão que “executar a lei do Senhor”, “fazer a justiça, não torcer o juízo”.

– No entanto, quando passamos a usar a nossos próprios critérios e interesses para julgar aos outros, para proferir juízos, deixando a lei de Deus de lado, deixando a “reta justiça”, arrogamo-nos o direito de assumir todos os poderes, como se fôssemos o Todo-Poderoso, o Criador de todas as coisas.

– O Senhor Jesus, antes de subir aos céus, disse aos Seus discípulos que Lhe fora dado todo o poder nos céus e na terra (Mt.28:18), afirmação que sempre nos é lembrada como uma garantia de que não temos o que temer no desempenho da Grande Comissão enquanto estivermos aqui neste mundo, já que o Senhor, com todo o poder, garante-nos a vitória sobre as hostes espirituais da maldade.

– Se tal interpretação é correta, devemos, também, verificar que a expressão do Senhor Jesus tem um outro sentido, qual seja, a de que é Ele o Todo-Poderoso e que, portanto, só devemos, em nossa vida cristã sobre a face da Terra, obedecer-Lhe, fazendo tudo quanto Ele nos tem mandado (Mt.28:20). Aliás, quando o Senhor nos manda ensinar aos homens o que Ele nos tem mandado, está, em primeiro lugar, a exigir que cumpramos o que Ele nos mandou, pois, sem o exemplo próprio, será impossível ensinarmos os outros.

– Neste passo, aliás, vemos, claramente, que o julgamento que nos é permitido, pela nossa condição de racionalidade, é o julgamento das atitudes das pessoas à luz da Palavra de Deus. Julgamos condutas, comportamentos, diante do critério objetivo das Escrituras Sagradas, da lei de Deus, mas não podemos julgar pessoas, o seu âmago, a sua individualidade.

OBS: “…quando criticamos e condenamos outras pessoas, estamos, de fato, pronunciando nosso próprio veredicto sobre a espiritualidade e o destino delas. Esta acusação mostra que Tiago não está proibindo as distinções próprias e necessárias que devem ser feitas por todos os cristãos. Ele também não está proibindo o direito que a comunidade tem de excluir de sua comunhão aqueles que ela supõe estarem em flagrante desobediência aos padrões da fé, nem proibindo que se determine o certo e o errado entre seus membros (1 Co 5-6).

 A preocupação de Tiago é com o discurso invejoso e de censura, pelo qual condenamos outras pessoas como erradas à vista de Deus…” (MOO, Douglas J. Tiago: introdução e comentário. Trad. Robinson Malkomes. Escriba digital, p.152).

– Este é um ponto importante e do qual já falamos quando do estudo da lição 6, quando tratamos da questão da acepção de pessoas, que é assunto umbilicalmente ligado à questão do julgamento. Mesmo quando uma pessoa desobedece à Palavra de Deus, peca, não podemos julgá-la pelo que ela é, mas, sim, pelo que ela fez, à luz da lei divina. Não temos o direito de considerar a pessoa, ainda que pecadora contumaz e rebelde, como inferior a nós mesmos, mas, sim, devemos repreender e condenar a atitude pecaminosa, sem, no entanto, fazer qualquer juízo sobre a essência do pecador.

– É este um discrímen que devemos pedir a Deus que nos dê capacidade para fazer. Devemos, sim, julgar os atos e as atitudes das pessoas à luz da Palavra de Deus, mas jamais devemos julgar as pessoas em si mesmas, jamais devemos nos considerar superiores, melhores do que elas, ainda que estejam enredadas no pecado. Não nos cabe pôr alguém no céu ou no inferno, embora nos caiba falar se esta ou aquela atitude é correta, ou não.

– A nossa atitude para com o próximo é a de amá-lo, ou seja, querermos o seu bem e fazermos tudo que está ao nosso alcance para que ele seja beneficiado. Assim como lutamos contra o pecado em nós mesmos, a fim de conseguirmos perseverar até o fim para sermos salvos, também devemos desejar que o outro consiga a sua salvação e, para tanto, devemos anunciar-lhe Cristo Jesus, pregar o Evangelho, falar a ele a verdade, que é a Palavra de Deus.

– Trata-se, porém, de uma atitude que somente conseguiremos ter se deixarmos que Deus nos governe, pois precisamos ter compaixão, ou seja, sentir exatamente o que o outro está sentindo. Quando somos compassivos, e isto é possível se negarmos a nós mesmos e deixarmos o Espírito Santo dominar nosso interior, sentimos a miséria do pecador, passamos a ter-lhe afeição e a desejar ardentemente a sua restauração espiritual, amando-o ao mesmo tempo em que aborrecemos o pecado por ele praticado.

– Era assim que Jesus Se conduzia neste mundo. O Senhor tinha compaixão pelos pecadores (Mt.9:36; 14:14; 20:34; Lc.7:13), mas jamais concordou ou consentiu com o pecado. Este deve ser o procedimento de todo aquele que segue os Seus passos.

– Nos dias em que vivemos, duas atitudes equivocadas têm sido tomadas por aqueles que cristãos se dizem ser. Uns, contrariando o ensino que nos dá Tiago, arvoram-se em “inquisidores”, “juízes”, condenando, de antemão, as pessoas ao fogo do inferno, julgando as pessoas por causa dos erros que cometeram. São os “santarrões”, os “modernos fariseus”, que se arvoram em “aferidores de medida”, repetindo o gesto do fariseu na parábola do fariseu e do publicano, esquecendo-se de que tais pessoas não alcançam justificação da parte de Deus (Lc.18:9-14).

– Outros, porém, dentro de uma suposta “lógica do amor”, tendem a se utilizar do ensino de Tiago para compactuarem e consentirem com o pecado. Dizem que “não podem julgar” e, por isso, toleram toda e qualquer prática pecaminosa, inclusive dentro da igreja local. Tais pessoas também se esquecem do que ensina o apóstolo Paulo que, ao descrever a corrupção geral da humanidade, diz que são dignos de morte tanto os que pecam como os que consentem com o pecado (Rm.1:32) ou do que diz o próprio Senhor Jesus na sua repreensão ao anjo da igreja em Tiatira, que tolerava Jezabel e suas práticas pecaminosas (Ap.2:20).

– Paulo, aliás, mostra bem como deve ser a conduta do verdadeiro e genuíno cristão, quando trata do caso daquele membro da igreja de Corinto que estava a abusar da mulher de seu pai. Ao mesmo tempo em que o apóstolo recrimina a tolerância da igreja local com aquele pecado e exigia punição exemplar do iníquo (I Co.5:1-5), depois manda que a mesma igreja perdoasse aquele pecador, uma vez que havia se arrependido e não se poderia ferir a sua pessoa (II Co.2:5-8). É preciso condenar o pecado, mas jamais se deve deixar de amar o pecador.

– Por isso, devemos sempre combater o pecado, denunciá-lo, lutar contra ele, não permitir que seja tolerado seja em nós, seja na igreja, seja na sociedade, mas jamais devemos atacar o pecador, devemos amá-lo e fazer com que ele possa ser alcançado pela graça de Deus e, deste modo, arrependa-se da sua conduta pecaminosa e obtenha a salvação na pessoa de Cristo Jesus. É esta a tarefa da Igreja.

– Mas há, ainda, um ponto pelo qual não podemos, de forma alguma, nos arrogar o direito de julgar o outro. Somos imperfeitos, falíveis e, portanto, quando nos pomos como critério de julgamento do outro, corremos o risco de sermos condenados por nós mesmos.

– Paulo ensina-nos isto em Rm.2:1, ao dizer que, quando julgamos a outrem, tornamo-nos indesculpáveis diante de Deus na medida em que condenamos o outro mas fazemos exatamente o que ele fez e foi alvo de nossa condenação.

– Quando nos arrogamos o poder de sermos juízes e legisladores e condenamos ao próximo, estamos nos condenando a nós mesmos, já que, a exemplo deste próximo, também pecamos e cometemos erros. Assim, na medida com que medirmos os outros, também seremos medidos por eles e, desta maneira, nós mesmos nos condenaremos e, se isto fosse pouco, ainda por cima entesouramos ira para nós no dia da ira e da manifestação do juízo de Deus (Rm.2:5).

– Como diz o apóstolo: “Tu, pois, que ensinas a outro, não te ensinas a ti mesmo? Tu, que pregas que não se deve furtar, furtas?” (Rm.2:21). Quando nos pomos como medida para os outros e, com base neste critério egocêntrico, condenamos o outro, estamos a nos condenar a nós mesmos, visto que não somos melhores do que o próximo, como nos consideramos e, assim, haveremos de praticar o mesmo que o outro que por nós foi condenado praticou e, por isso mesmo, estaremos assinando a nossa própria sentença de morte.

– Diante deste quadro, não há como nos pormos em nosso devido lugar, na nossa insignificância, jamais condenando quem quer que seja, mas admitindo nossa falibilidade e tomando como critério único e exclusivo a Palavra de Deus, fazendo nossos julgamentos à luz dela, mas sempre condenando o pecado, mas mantendo o nosso amor e compaixão pelo pecador.

II – O PLANEJAMENTO À REVELIA DE DEUS  

– Depois de ter falado a respeito da necessidade que temos de jamais falarmos mal do irmão, Tiago passa a tratar de outra faceta do perigo da presunção humana que assola a vida espiritual sobre a face da Terra: o planejamento à revelia de Deus.

– Trata-se de um outro tópico que está logicamente encadeado com o anterior. Com efeito, quando nos arrogamos o direito de sermos legisladores e juízes, quando desconsideramos a soberania divina, é uma consequência natural que nos achemos no controle de nossas vidas e, portanto, que, dentro desta presunção, elaboremos planos à revelia do Senhor.

– Mas, desde o início deste estudo, estamos a falar do perigo da presunção humana. Mas em que consiste a “presunção”? Que significa ela?

– A palavra “presunção” vem da raiz “sum-“, que tem o significado, entre outros, de “’tomar, agarrar, apoderar-se, apropriar-se; atribuir-se, arrogar-se, roubar; tomar (comendo ou bebendo)”. Portanto, tem-se aqui uma continuidade da atitude de autossuficiência e arrogância que o homem assume quando se deixa levar pela carne, desconsiderando Deus como Ele não existisse.

– No original grego em Tg.4:16, temos a palavra “aladzoneia” (άλαζονεία), que a Bíblia de Estudo Palavra Chave ensina ter como significado “…fanfarrão, i.e., (por implicação) autoconfiança;— jactância, orgulho” (verbete 212, p.2048).

– A “presunção” é “ato de presumir ou de se presumir; julgamento baseado em indícios, aparências; suposição que se tem por verdadeira; opinião demasiado boa e lisonjeira sobre si mesmo; demonstração pública dessa opinião; imodéstia, pretensão, vaidade; confiança excessiva em si mesmo; pretensão”. O homem torna-se presunçoso quando pensa que tem o controle sobre si mesmo, quando crê que é “igual a Deus” e que sua vontade sempre prevalecerá no dia-a-dia de sua existência sobre a face da Terra.

– Por isso, Tiago recrimina quem afirma “Hoje ou amanhã, iremos a tal cidade, e lá passaremos um ano, e contrataremos, e ganharemos” (Tg.4:13). Quem afirma isto, e é comum agirmos deste modo, está desconsiderando que não temos domínio algum sobre o segundo seguinte de nossas vidas e, portanto, não podemos confiar que o que queremos será realizado.

– Quando dizemos que faremos alguma coisa agora ou amanhã, estamos nos pondo acima do tempo, como se fôssemos Deus, pois só Deus é atemporal, já que Ele próprio criou o tempo, na medida em que só o Criador é eterno, sendo as demais criaturas ou absolutamente temporais ou, então, eviternas, ou seja, tendo um início, embora não tenham fim, como é o caso dos anjos e dos homens.

 OBS: “…A presunção vem de um entendimento errado de nós mesmos e das nossas ambições. A presunção é assegurar a nós mesmos que o tempo está do nosso lado e à nossa disposição. Presunção é fazer os nossos planos como se estivéssemos no total controle do futuro. Presunção é viver como se nossa vida não dependesse de Deus.…” (LOPES, Hernandes Dias. Tiago: transformando provas em triunfo. Emmanuelle Digital, p.92).

– A afirmação mencionada por Tiago é, portanto, a exteriorização de um sentimento de autossuficiência, arrogância, de quem se acha no controle de todas as coisas, quando, na verdade, somos criaturas que não sabemos sequer se, no próximo segundo, ainda estaremos vivos.

– Mais uma vez, devemos aqui interpretar corretamente esta passagem bíblica, pois, infelizmente, alguns, ao se depararem com esta assertiva do irmão do Senhor, condenam todo e qualquer projeto, todo e qualquer planejamento que seja feito, dizendo que isto é “presunção”.

– Deus nos fez como seres racionais e, do mesmo modo que é inevitável que o homem, por se tratar de um ser pensante, profira juízos e julgamentos, de igual modo, o ser humano há de fazer planos e projetos, pois é dotado de imaginação e, se Deus o fez assim, não poderia condená-lo por planejar ou projetar algo.

– Enquanto estamos neste mundo, devemos, sim, fazer projetos ou planos, pois isto é inevitável para todo homem, máxime aquele que está em comunhão com o Senhor e, por isso, tem a mente de Cristo (I Co.2:16). Deus é um ser planejador (Jó 42:2 ARA) e, como feitos à Sua imagem e semelhança, é natural que também tenhamos planos.

– Na verdade, o Senhor Jesus, certa feita, disse que é essencial que, na vida sobre a face da Terra, sejamos planejadores, pois a falta de planejamento é um indício de tolice, de falta de sabedoria, como nos mostra Seu ensinamento em Lc.14:28-32, ensino este que foi dado em meio à própria necessidade da renúncia de si mesmo para seguir a Cristo. O seguidor de Cristo, embora renuncie a si mesmo, não está proibido, mas, antes, é instado a fazer planos, pois, de outro modo, não poderia se conduzir sabiamente neste mundo.

– O que Tiago está a considerar, portanto, não é o plano em si, mas o fazer-se planos desconsiderando-se a vontade de Deus. O que não podemos fazer é começar a planejar algo sem querer saber qual é o propósito de Deus, qual é a Sua vontade, desconsiderando o Senhor em nosso planejamento. OBS: “…Obviamente Tiago não está combatendo a questão do planejamento, mas combatendo o planejamento sem levar Deus em conta.…” (LOPES, Hernandes Dias. Tiago: transformando provas em triunfo. Emmanuelle Digital, pp.92-3).

– Aqui, a exemplo do julgamento, temos a condenação de uma atitude própria da racionalidade humana mas que é exercida em desconsideração à nossa condição de criaturas diante do Criador. O planejamento em si é uma necessidade, algo inevitável, mas o planejamento à revelia do Senhor é demonstração de arrogância, uma inadmissível presunção.

– Já temos dito em alguns de nossos comentários ao longo destes anos que muitos sedizentes cristãos comportam-se como “crentes medidas provisórias”, ou seja, são pessoas que planejam algo e começam a executá-lo, sem consultar ao Senhor, sem levar em conta a Sua vontade. Comportam-se, assim, como o Presidente da República que, ao editar uma “medida provisória”, ela já tem força de lei, independentemente da manifestação da vontade do Congresso Nacional, que poderá confirmá-la ou revogá-la, mas, enquanto isto, já está valendo como se lei fosse. Estes cristãos fazem o que querem e depois pedem a “confirmação” de Deus, como se o Senhor fosse um mero ratificador de suas vontades, como se Ele estivesse a serviço do ego de cada um deles.

– Devemos ser “crentes projetos de lei”, ou seja, devemos elaborar nossos planos e projetos, pois não estamos proibidos de fazê-lo, somos até aconselhados pelo Senhor Jesus para os fazer, mas, depois de eles terem sido elaborados, devemos levá-los aos pés do Senhor para que Ele os aprove, ou não. Devemos fazer sempre a vontade de Deus, se quisermos ter a vida eterna, pois só quem faz a vontade do Senhor permanecerá para sempre (I Jo.2:17).

A exemplo do Presidente da República que, quando manda um projeto de lei para o Congresso Nacional, aguarda a manifestação da vontade do Legislativo e o projeto somente se tornará lei quando for aprovado, devemos também levar nossos planos e projetos para o Senhor e somente quando Ele os aprovar é que poderemos pô-los em prática.

– Tiago é claríssimo ao mostrar que, quando dizemos que hoje ou amanhã faremos tal e tal coisa e que, no ano seguinte, teremos feito isto ou aquilo, estamos a demonstrar, a todos os homens, que não consideramos Deus em nossas vidas, que vivemos como se Ele não existisse, deixando à margem de nossas considerações e elucubrações a Sua vontade.

– Não foi isto que o Senhor Jesus nos ensinou, pois, quando nos mostra como devemos orar, diz que devemos pedir que a vontade de Deus seja feita tanto na terra como no céu (Mt.6:10), expressão que é muito elucidativa, vez que nos mostra que a vontade de Deus precisa ser feita primeiro na Terra, já que no céu ela já é feita naturalmente. Tal expressão, também, reforça que precisamos que a vontade de Deus seja realizada e observada e que tal vontade precisa ser primeiramente realizada em nós mesmos.

– O saudoso pastor Walter Marques de Melo (1933-2012) sempre insistia nesta passagem da epístola universal de Tiago, ensinando-nos que é imperioso que sempre quando formos exteriorizar qualquer plano ou projeto, jamais devemos nos esquecer de dizer “se o Senhor quiser”. Precisamos sempre mostrar a todos que nos cercam que estamos aqui neste mundo para cumprir a vontade do Senhor e que nos atemos tão somente a ela e a nada mais.

– Jesus, nas Suas últimas instruções aos Seus discípulos, foi categórico ao dizer que sem Ele nada podemos fazer (Jo.15:5 “in fine”). Esta necessária e indispensável presença do Senhor começa no Seu querer. Nada que tenhamos projetado ou planejado pode escapar do crivo da vontade de Deus. Agir após o planejamento sem que tenhamos consultado ao Senhor é uma presunção que nos põe como alvo do juízo divino, pois estaremos a atentar contra a soberania divina. Pensemos nisto!

– Este deve ser o comportamento do genuíno e autêntico servo do Senhor. Como diz Tiago, em lugar da presunção, devemos dizer: “Se o Senhor quiser, e se vivermos, faremos isto ou aquilo” (Tg.5:15). Temos agido assim, amados irmãos?

– Nesta expressão de Tiago, é importante frisarmos que o irmão do Senhor põe duas condições para que alguma ação ou atitude planejada seja efetivamente executada: a vontade de Deus e a nossa própria existência terrena: “se o Senhor quiser e se vivermos”. OBS: “…Um homem cristão, ao fazer os seus planos, deve reconhecer a sua dependência de Deus e dizer, Deo volente, se o Senhor quiser.…” (COMENTÁRIO Bíblico Moody Tiago, p.22)

– Sobre a vontade de Deus já falamos, mas e esta condição da nossa existência terrena? “Se vivermos”, diz Tiago, expressão que, no original grego, representa a vida biológica, a vida física, uma duração de vida (“dzáo” — ζάω), mostra outra coisa que devemos ter sempre em mente, ou seja, de que a nossa existência sobre a face da Terra está nas mãos do Senhor, que é quem dá e quem toma a vida (I Sm.2:6).

– Devemos ter consciência de que a nossa passagem aqui sobre a face da Terra depende única e exclusivamente da vontade de Deus, que é uma clara e insofismável demonstração de que somos menos do que nada e que, portanto, dependemos do Senhor, devendo estar prontos para, a qualquer momento, termos de nos apresentar diante d’Ele para o exercício do Seu juízo preliminar (Hb.9:27).

– Os filósofos existencialistas, ao refletir sobre a existência humana sobre a face da Terra, chegaram à conclusão de que toda a existência do homem estava marcada pelo que chamaram de “angústia da morte”, pois o homem é o único ser que sabe que vai morrer, que vai deixar de existir nesta dimensão terrena. No entanto, os existencialistas forjaram esta ideia da “angústia da morte” precisamente porque deixaram de lado a existência de Deus, pois não poucos dos existencialistas eram ateus confessos.

– Para quem não crê em Deus, seja teórica, seja praticamente, é, realmente, angustiante saber que, num determinado instante, ele deixará de existir nesta dimensão terrena. Esta perspectiva faz com que ele não veja sentido na vida ou, em busca de um sentido, passe a valorizar as coisas terrenas além da conta.

Aliás, era isto mesmo o que se propagou no final da década de 1960, quando, sob a influência notadamente do filósofo existencialista francês Jean Paul Sartre (1905-1980), multidões de jovens passaram a defender o lema “É proibido proibir”, vendo na libertinagem e na ausência de limites um escape para a falta de sentido na vida que já se sabe que terminará.

– No entanto, Tiago mostra-nos que o servo de Deus, embora saiba que sua existência neste mundo um dia findará e, mais ainda, que é algo muito efêmero e limitado, diante da infinitude e da eternidade de Deus, não vive em angústia, não vive desanimado a fazer planos ou projetos, mas, ao revés, encara esta situação com naturalidade, sabendo que, diante desta realidade que não pode ser negada, ele precisa, o quanto antes, viver segundo a vontade do seu Criador e estar pronto para encontrar-Se com Ele, certo de que, tendo confiando n’Ele e feito a Sua vontade, o fim da peregrinação terrena representará tão somente a oportunidade para ser aprovado pelo Senhor e, então, poder desfrutar da glória ao lado d’Aquele que o criou e que quer que ele sempre esteja em Sua companhia.

– Nossa vida sobre a face da Terra é efêmera, um simples “vapor que aparece por um pouco e depois se desvanece” (Tg.4:14); “dias mais velozes do que a lançadeira do tecelão” (Jó 7:6), mas isto, em vez de nos angustiar ou de nos levar à busca desenfreada da satisfação das paixões, faz-nos aproximar ainda mais de Deus, saber que aqui estamos para fazer a Sua vontade, sabendo que quem assim age permanece para sempre, suplanta estas limitações temporais para estar para sempre junto com o Senhor.

– Quem vive desta maneira preconizada por Tiago tem a consciência de que está aqui neste mundo para glorificar a Deus, visto que almeja a glória de Deus. Para chegarmos à glória de Deus, precisamos, antes de mais nada, glorificá-l’O aqui na Terra, como fez o Senhor Jesus (Jo.17:4).

OBS: “…Havia começado a lhes dizer: que é, com efeito, o homem e o que é a vida humana, senão, como está escrito, ‘ um vapor que aparece por um pouco de tempo (Tg.4:14)?’ Refleti, então, meus irmãos, em vossa fragilidade, em vossa baixeza, em vossa condição carnal, nas rápidas mudanças que se fazem neste mundo e reconhecei que, para ser felizes, deveis pôr todas as vossas esperanças unicamente n’Aquele no seio d’O qual podeis estar em segurança. Mas como pôr n’Ele nossas esperanças se não obedecemos aos Seus preceitos?…” (AGOSTINHO. Sermão XXIV – Grandeza e severidade de Deus-I, cit. Tg.4:13-15, n.24. Disponível em: http://www.clerus.org/bibliaclerusonline/pt/index.htm Acesso em 15 jul, 2014) (tradução nossa de texto em francês).

– Se, porém, não quisermos saber qual é a vontade de Deus, se vivermos como se Deus não existisse, estaremos querendo a glória para nós mesmos, querendo transformar esta nossa peregrinação terrena em uma indevida oportunidade para nos gloriarmos a nós mesmos e uma tal glória, diz o irmão do Senhor, é maligna, resultado da nossa presunção (Tg.4:16), exercício tolo e vão da crença na mentira satânica de que somos iguais a Deus.

– Vivemos dias em que tal mentalidade é predominante, inclusive entre os que cristãos se dizem ser. As pessoas querem glória para si, põem-se como centro do universo e das atenções, negando-se a glorificar ao Senhor, razão pela qual seus discursos se desvanecem e o seu coração insensato se obscurece. Consequentemente, dizendo-se sábios, tornam-se loucos, dando início a um processo de degeneração, como descreve o apóstolo Paulo em Rm.1:21-32 e, mais uma vez, vemos como Paulo e Tiago combinam-se em cada detalhe.

– Como temos agido em nosso dia-a-dia. Será que temos evitado o perigo da presunção humana? Pensemos nisto. Amém!

Ev. Dr. Caramuru Afonso Francisco  

Site: http://www.portalebd.org.br/files/3T2014_L11_caramuru.pdf

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